Voltando pra casa, Francisquim
colocou por engano uma fita com músicas de Clara Nunes pra tocar. Pernalonga
falou para ele ficar de ouvido atento pra Sagarana, música com letra de João de
Aquino e Paulo César Pinheiro. De resto, tudo foi silêncio.
Chegando na casa de Pernalonga, Chiquim parou o carro no meio da ladeira,
em frente a casa de um vizinho, e falou:
- Dá tempo de fumar um baseado
contigo. Pode ser?
- E vai deixar o carro aí? Não pode.
- O quê. Não tem problema. Não vão bater
nele. E não tem guincho aqui. Vamos.
Francisquim abriu o porta-malas,
Pernalonga pegou o pacote deixado ali e os dois subiram as escadas meio
enlameadas que iam dar na casinha do segundo.
No meio do caminho, Pernalonga fez
um costumeiro gesto de silêncio para o amigo. Era pra não fazer barulho
enquanto passavam pela casa do tio, que ficava no meio do caminho. Fizeram
silêncio e passaram. Pernalonga se arrependeu depois, achou que devia ter feito
barulho. Que agora ia fazer barulho pra sempre. Que nunca fez silêncio por
respeito, sempre fazia por medo. Não ia transformar medo em respeito por causa
de uma cosia tão simples quanto a morte. Ia fazer barulho agora. Sempre.
Chegando a casa de Pernalonga, se
sentaram na varanda, nos mesmos lugares que algumas horas antes. O dono da casa
abriu o pacote no colo, sob a luz de um poste que, na rua de cima, iluminava
muito pouco. Às sombras viu mesclar o esverdeado dos camarões de maconha.
- Nunca na vida pensei que ia ver
uma coisa assim, tão bonita. – falou Pernalonga.
- Ah, agora falou bonito. Isso é que
é uma paixão que eu valorizo – disse Francisquim, pegando um pedaço de camarão
no pacote. – Tão logo você se encanta, já se faz necessário queimá-la toda,
embriagar-se para esquecer. Isso que é amor. O resto é inquietação.
Pernalonga sacou uma pequena folha
de celulose.
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