Um
pouco depois de Pernalonga entrar em casa e sair com garrafa de vodka pela
metade nas mãos, Darío Vuturuá notou na vermelhidão do que via, que estava de
pé junto a um precipício onde um dia esteve uma escada. Se caísse, bau-bau, ia
virar história e ninguém ali tinha aprendido a porra do seu nome para que a
história ficasse boa.
Respirou
mais um pouco da goiaba sinestésica que estava no ar e se juntou aos outros
caras, que agora maquinavam um jeito de conseguir maconha, antes que entrassem
de vez na idéia da vodka (que Darío já estava bicando) e acabassem rumando para
o pó, que era um rumo que normalmente deixava as pessoas sem dormir, mas
inexplicavelmente acordando-os longe de casa, em algum lugar ermo, com o nariz
coçando, a cocaína no fim e uma diarréia dos infernos. Sem contar que, nesses
casos, quase não se conseguia voltar para casa depois de uma aventura como
essa, onde o tempo se extinguia ao invés de ficar mais ameno e favorável, como
no caso da erva.
O suor fazia com que os
óculos de Darío escorressem nariz abaixo, algo que ele remediou colocando as
hastes por dentro do cabelo sobre as orelhas. Convenhamos, o rapaz estava tenso
de estar ali, no meio daquele bando de anormais (olhe!, o taxista que o trouxe
até ali estava subindo em uma árvore, facão na mão, dizendo que ia pegar uma
fruta-pão, mas antes que ele alcançasse um certo galho, escorregou árvore
abaixo, detendo-se numa poça de lama antes que escorresse pelo barranco como
uma laranja podre), e a vodka colaborava para tornar a sua primeira noite em
Macuco uma das mais quentes de sua vida.
Jorge
Tadeu, o taxista, lavava o rosto e as pernas, rindo, bebericando da garrafa de
vodka, cada vez mais perto de acabar, sabendo que em breve todos acabariam
caindo de nariz, depois de baterem na porta de um e outro, tentando descolar
uma mistura sádica de coca com mármore e comprimido para dor-de-cabeça
esmigalhado. E, embora Jorge Tadeu soubesse com certeza onde descolar maconha
àquela hora, achava Pernalonga sujeira demais para ir junto.
Felizmente,
foi o próprio Pernalonga quem começou a expulsar todos de lá. O caso é que todo mundo, menos Pernalonga, desceu aos
tropeços até a rua onde estava estacionado o Corcel 82, motor 1.6 à gasolina e
de motor azul que o avô de Jorge Tadeu chamava de Banheirão. Darío foi
imprensado no banco de trás com Samurai, que tão naturalmente quanto se fora,
voltara.
“Se liga, Urutum”, falou Tompinhão-Coelho para Darío
“este é o Samurai, ele pode chegar sem avisar, que é gente boa. Fica
tranqüilo.”
“Tudo bem, cara?”
Darío respondeu que sim a Samurai, que ele agora começava
a notar que em nada se parecia com um japonês do período feudal, tampouco com o
Tom Cruise. Mas ainda assim, após recolocar os óculos no lugar, sobre o nariz,
algo que ele fazia constante, às vezes com o dedo do meio, outras com o
indicador e na maior parte do tempo simplesmente pegando toda a armação e
apertando contra o rosto, ainda assim Darío estava com o cuzinho apertado,
porque sabia no que resultaria aquela viagem de carro acompanhado daqueles
malucos. E ele detestava a tensão exagerada à que todos se submetiam quando
batiam a madrugada atrás de um traficante.
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