sexta-feira, 18 de abril de 2014

Seqüência 6 - Macuco Beleza



            Um pouco depois de Pernalonga entrar em casa e sair com garrafa de vodka pela metade nas mãos, Darío Vuturuá notou na vermelhidão do que via, que estava de pé junto a um precipício onde um dia esteve uma escada. Se caísse, bau-bau, ia virar história e ninguém ali tinha aprendido a porra do seu nome para que a história ficasse boa.
            Respirou mais um pouco da goiaba sinestésica que estava no ar e se juntou aos outros caras, que agora maquinavam um jeito de conseguir maconha, antes que entrassem de vez na idéia da vodka (que Darío já estava bicando) e acabassem rumando para o pó, que era um rumo que normalmente deixava as pessoas sem dormir, mas inexplicavelmente acordando-os longe de casa, em algum lugar ermo, com o nariz coçando, a cocaína no fim e uma diarréia dos infernos. Sem contar que, nesses casos, quase não se conseguia voltar para casa depois de uma aventura como essa, onde o tempo se extinguia ao invés de ficar mais ameno e favorável, como no caso da erva.
O suor fazia com que os óculos de Darío escorressem nariz abaixo, algo que ele remediou colocando as hastes por dentro do cabelo sobre as orelhas. Convenhamos, o rapaz estava tenso de estar ali, no meio daquele bando de anormais (olhe!, o taxista que o trouxe até ali estava subindo em uma árvore, facão na mão, dizendo que ia pegar uma fruta-pão, mas antes que ele alcançasse um certo galho, escorregou árvore abaixo, detendo-se numa poça de lama antes que escorresse pelo barranco como uma laranja podre), e a vodka colaborava para tornar a sua primeira noite em Macuco uma das mais quentes de sua vida.
            Jorge Tadeu, o taxista, lavava o rosto e as pernas, rindo, bebericando da garrafa de vodka, cada vez mais perto de acabar, sabendo que em breve todos acabariam caindo de nariz, depois de baterem na porta de um e outro, tentando descolar uma mistura sádica de coca com mármore e comprimido para dor-de-cabeça esmigalhado. E, embora Jorge Tadeu soubesse com certeza onde descolar maconha àquela hora, achava Pernalonga sujeira demais para ir junto.
            Felizmente, foi o próprio Pernalonga quem começou a expulsar todos de lá. O caso é que todo mundo, menos Pernalonga, desceu aos tropeços até a rua onde estava estacionado o Corcel 82, motor 1.6 à gasolina e de motor azul que o avô de Jorge Tadeu chamava de Banheirão. Darío foi imprensado no banco de trás com Samurai, que tão naturalmente quanto se fora, voltara.
            “Se liga, Urutum”, falou Tompinhão-Coelho para Darío “este é o Samurai, ele pode chegar sem avisar, que é gente boa. Fica tranqüilo.”
            “Tudo bem, cara?”
            Darío respondeu que sim a Samurai, que ele agora começava a notar que em nada se parecia com um japonês do período feudal, tampouco com o Tom Cruise. Mas ainda assim, após recolocar os óculos no lugar, sobre o nariz, algo que ele fazia constante, às vezes com o dedo do meio, outras com o indicador e na maior parte do tempo simplesmente pegando toda a armação e apertando contra o rosto, ainda assim Darío estava com o cuzinho apertado, porque sabia no que resultaria aquela viagem de carro acompanhado daqueles malucos. E ele detestava a tensão exagerada à que todos se submetiam quando batiam a madrugada atrás de um traficante.

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