Enfie uma linha fina através dos
espaços brancos da calota de um Gurgel. Prenda o carretel junto ao portão da
fábrica deste veículo. Agora vislumbre o agitado carretel girar sobre a própria
base, sôfrego, correndo sem sair do lugar, todas as idas e vindas deste carro
em particular cruzando pontos e destinos, uma emaranhada teia de memórias
ganhando vida com um simples movimento, as diferentes vibrações trazendo ao
presente momentos simples como uma viagem até uma determinada esquina para
levar uma paixão até a casa da tia e, trinta anos depois, a mesma esquina,
imersa em lembranças d’outra época, e de repente já não é mais o passado
solitário, tampouco o presente apressado, é outra coisa, uma quarta vertente de
tempo, algo além, quase como se abarcasse o tudo, a Kundalini desenrolada, a
língua pressionada contra o palato, o gozo contido, represado e implodido, o
universo se comunicando do útero para fora, como a vida, num desembucetamento
final. Assim é o todo. Essas linhas que se cruzam, essas vibrações que não
cessam, assim funciona a vida. Nessa coisa confusa, que alguns apelidam de
caos, outros ousam chamar de destino, foi aí, nessa coisa, nessa conta, que
Pernalonga encontrou Dário. O que aconteceu é depois dessas complicações que,
vez por outra, o caos, o destino e a vida cismam de nos enfiar goela abaixo.
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