domingo, 18 de maio de 2014

Seqüência 15 - pausa para respirar



            Enfie uma linha fina através dos espaços brancos da calota de um Gurgel. Prenda o carretel junto ao portão da fábrica deste veículo. Agora vislumbre o agitado carretel girar sobre a própria base, sôfrego, correndo sem sair do lugar, todas as idas e vindas deste carro em particular cruzando pontos e destinos, uma emaranhada teia de memórias ganhando vida com um simples movimento, as diferentes vibrações trazendo ao presente momentos simples como uma viagem até uma determinada esquina para levar uma paixão até a casa da tia e, trinta anos depois, a mesma esquina, imersa em lembranças d’outra época, e de repente já não é mais o passado solitário, tampouco o presente apressado, é outra coisa, uma quarta vertente de tempo, algo além, quase como se abarcasse o tudo, a Kundalini desenrolada, a língua pressionada contra o palato, o gozo contido, represado e implodido, o universo se comunicando do útero para fora, como a vida, num desembucetamento final. Assim é o todo. Essas linhas que se cruzam, essas vibrações que não cessam, assim funciona a vida. Nessa coisa confusa, que alguns apelidam de caos, outros ousam chamar de destino, foi aí, nessa coisa, nessa conta, que Pernalonga encontrou Dário. O que aconteceu é depois dessas complicações que, vez por outra, o caos, o destino e a vida cismam de nos enfiar goela abaixo.

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